Convidado - A viagem rumo ao oeste de Babetida Sadjo
RFI
De segunda a sexta-feira (ou, quando a actualidade o justifica, mesmo ao fim de semana), sob forma de entrevista, analisamos um dos temas em destaque na actualidade.
Episodes
Músico cabo-verdiano Mário Lúcio lança novo álbum "Independance" em concerto em Paris
1/31/2025
O músico, autor, compositor e antigo Ministro da cultura de Cabo Verde, Mário Lúcio deslocou-se esta semana aos estúdios da RFI antes de participar no festival musical "Au fil des voix", na sala de concerto 360 aqui em Paris, onde vai tocar e cantar neste sábado 1 de Fevereiro a partir das 20H00.
Por ocasião deste certame que homenageia este ano alguns países de África Lusófona pelos 50 anos das suas respectivas independências, Mário Lúcio representa Cabo Verde, com o seu novo álbum lançado oficialmente neste 31 de Janeiro.
Este novo trabalho que é o seu sétimo álbum em nome próprio, intitula-se "Independance", com "A" para evocar a palavra "dança". Nele, o músico recorda e retoma alguns dos êxitos do pós-independência. Com 10 anos de idade na altura em que o seu país conquistou a liberdade, Mário Lúcio lembra-se nomeadamente do fervilhar musical daquela época e diz que a sua vida mudou completamente com a independência.
RFI: Quais são as sonoridades deste novo álbum?
Mário Lúcio: Quando nós falamos de independência ou de qualquer acontecimento, nós temos a parte analítica e depois temos uma memória escondida. E é engraçado que isto só me aconteceu há pouco tempo. Qual é a minha memória da independência? Eu tinha dez anos. Para além de analisar, é bom lembrar-me das festas. Mas qual é a memória? É a música. Portanto, há pessoas que têm memória de lugares através dos cheiros e a música, porque em 1975 chegaram a Cabo Verde músicas desconhecidas para nós. Nós somos um arquipélago de uma música muito particular no contexto africano e mundial. Uma mistura de música, de reminiscências de música africana com música europeia. E de repente, chega-nos a música do continente africano. Até lá, eu ia sempre a uma mercearia muito pequenita, lá no Tarrafal. O senhor tinha um gira-discos. O que é que nós ouvíamos? Era Roberto Carlos, Luiz Gonzaga e também ouvíamos muita música norte-americana, James Brown, Otis Redding, Percy Sledge. Era o que nós ouvíamos. É como se nos negassem o acesso à música do continente. África estava efervescente havia algumas décadas. Vários países foram independentes nos anos 60 e digamos que esconder isso evitava o contágio. Mas, de repente, chega a música da Guiné-Bissau -que nós não conhecíamos- na mesma língua. A música da Guiné-Conacri, aquelas guitarras, a música de Angola e a música do Congo, mais a música do Senegal, Gana, Camarões e Nigéria, mas também a música das Antilhas, Martinica, Guadalupe, Haiti. Então, é como se nós tivéssemos também achado a nossa própria identidade. E por casualidade, nós começamos a tocar essas músicas, aprender no violão os primeiros acordes que eu aprendi de uma música de um cantor chamado Prince Nico Mbarga. E a música chamava-se "Aki". Eram dois acordes. E depois fui tocar no grupo Abel Djassi, na cidade da Praia, quando fui lá estudar. E já tocávamos nos bailes nocturnos. Os bailes duravam das 20h00 às 05h00. Tínhamos repertório com 100 músicas. Fazíamos quatro intervalos e basicamente eram essas músicas. Então, depois que eu tomei a minha profissão do músico, depois de exercer outras profissões, sempre com a música, tinha o sonho de um dia recuperar essas memórias. Eu não sabia como é que haviam de vir e eu lembrei-me que era o som ligado à dança. Essas músicas chegaram com as danças. Eu lembrava no Tarrafal, as casas, umas casas muito velhas, cheias de gente, rapazes e meninas, cada um no seu canto, a dançar essas músicas, a tentar descobrir uma forma de dançar. As nossas danças são sempre muito coladas, o homem e a mulher. E esses ritmos não exigiam muito malabarismo. Então, a palavra "independance" reflecte a minha memória da independência. São músicas ligadas à dança. E esse disco é um disco para dançar. Felizmente, toquei muitos anos em baile. É uma coisa que eu gosto de fazer, então é um testemunho, digamos assim, uma homenagem a essa época.
RFI: Como é que foi todo esse trabalho de recolher as músicas do seu baú pessoal e reformulá-las?
Mário Lúcio: As...
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Leste da RDC: "O M23 está numa posição de força e quererá ter também um lugar à mesa de negociações"
1/30/2025
Desde domingo, os rebeldes do M23 apoiados por militares ruandeses entraram em Goma, no leste da RDC, na sequência de uma ofensiva "relâmpago" de apenas alguns dias contra as localidades em torno daquela que é a capital do Norte Kivu. De acordo com fontes diplomáticas do Ruanda, os M23, que se estimam ser apenas 3 mil homens, estão agora a progredir mais a sul e também a leste de Goma, havendo inclusivamente veleidades de chegarem até Kinshasa.
Perante esta situação, na sua primeira comunicação em dias, o Presidente congolês disse nesta quarta-feira à noite que quer "tranquilizar" a população do seu país e garantiu que actualmente está em curso uma "riposta vigorosa".
Felix Tshisekedi também criticou a falta de reacção da comunidade internacional e teceu advertências sobre o risco de escalada "com consequências imprevisíveis" na região.
Para além de novos apelos ao fim desta ofensiva emitidos pela ONU, a União Europeia, os Estados Unidos e a China, há novas iniciativas internacionais: a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), que no final de 2023 enviou uma força de paz para o leste da RDC (SAMIRDC) para apoiar as forças congolesas contra os M23, anunciou esta manhã que organiza uma cimeira extraordinária nesta sexta-feira na capital do Zimbábue sobre esta situação que qualificou de "preocupante".
Também visivelmente alarmado, o chefe da diplomacia francesa chegou hoje a Kinshasa para abordar esta crise com as autoridades locais.
Até agora, apesar dos esforços da mediação angolana, nenhuma das partes tem mostrado uma real intenção de inflectir a sua posição. A RDC recusa sentar-se à mesa das conversações com os M23 e pretende apenas discutir directamente com o Ruanda. Kigali, por sua vez, diz que se considera em perigo existencial enquanto o leste da RDC albergar grupos considerados hostis como as FDLR, um grupo rebelde formado por antigos genocidiários hutus.
Ao constatar uma escalada no conflito, Sérgio Calundunga, coordenador do Observatório Político e Social de Angola, diz que as acusações do Ruanda são antigas mas recorda que o potencial económico do leste da RDC, rico e recursos minerais, também não é alheio a esta situação.
RFI: Como vê a situação actualmente vigente no leste da RDC?
Sérgio Calundungo:Estamos a falar de uma região onde um enorme potencial económico convive com muitos interesses e grandes forças de bloqueio do potencial económico dos povos e, portanto, este tipo de acusações não são novas. Elas sempre existiram. Elas estiveram sempre presentes na tensão entre os dois países. Simplesmente, agora no terreno há um novo desenrolar. Estas incursões, sobretudo para pontos estratégicos importantes do M23, que criou novos focos de tensões, é uma situação muito grave. Anteriormente era um conflito latente ou até podemos considerar patente naquela região, mas nota-se claramente que há um aumento da escalada do conflito no terreno e também tensões entre os países na região: primeiramente, entre a RDC e o Ruanda, mas também começam a estalar os alarmes à volta de outros países da região que vão sofrer as consequências directas ou indirectas deste conflito.
RFI: O presidente do Congo Democrático esteve em conversações com a mediação angolana. O que é que julga que será a direcção a tomar agora perante este conflito?
Sérgio Calundungo: Do ponto de vista das autoridades angolanas e também um pouco de alguns países da região, a ideia é ter que fazer esforços ou redobrar esforços no sentido de desbloquear os canais de diálogo. Ou seja, a ideia é que cada vez mais a possibilidade de que a paz naquela região provirá de uma mesa de negociações envolvendo os principais actores, que é o Ruanda e também as autoridades da RDC. Entretanto, claramente que o M23 está numa posição de força e, contrariamente ao que tinha sido inicialmente previsto, quererá ter também um lugar à mesa de negociações e quererá ter alguma palavra.
RFI: Até agora, os M23 foram excluídos das negociações. A própria RDC tem...
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Saída de Mali, Níger e Burkina Faso da CEDEAO, "organização deve evitar que se repita"
1/29/2025
O Mali, Níger e Burkina Faso, liderados por regimes militares no poder após golpes de Estado, saíram esta quarta-feira, 29 de Janeiro, oficialmente da CEDEAO. Os três países, unidos na Aliança dos Estados do Sahel, desde Julho de 2023, acusam a CEDEAO de impor sanções injustas e de não oferecer apoio eficaz na luta contra o jihadismo. O investigador e antigo comissário da CEDEAO, Mamadú Jao, afirma que a decisão reflecte "o apoio popular, mas alerta que só o tempo dirá se foi a melhor escolha".
RFI: A insatisfação popular com a CEDEAO ficou evidente nas manifestações que celebraram a saída dos três países da organização, reforçando a ideia de que não se trata apenas de uma decisão política, mas também amplamente apoiada pela população?
Mamadú Jao: Termina hoje o período de reflexão de seis meses concedido a estes três países, e certamente, a partir de hoje, já estarão formalmente fora da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental. Podemos entender isso como uma decisão amplamente apoiada pelas populações, conforme demonstrado nas manifestações. O problema é que, na minha opinião, o tempo é o melhor juiz. Vamos ver se a decisão realmente reflecte a soberania desses Estados. Não é a primeira vez que isso acontece; a Mauritânia fez parte da CEDEAO, mas decidiu sair em 2000 para se aproximar dos países do Magrebe, mantendo, no entanto, relações cordiais com a comunidade. Em 2017, assinaram formalmente um acordo de aproximação, o que serve também como uma lição para a CEDEAO.
A CEDEAO e a Aliança dos Estados do Sahel mantêm a livre circulação de bens e pessoas. Que impacto tem a saída destes três países da CEDEAO?
De momento, ao passar de 15 para 12 países, já é um sinal negativo. A circulação de pessoas e bens é uma das cláusulas fundamentais da criação da CEDEAO. Se isso continuar, as relações certamente irão persistir de alguma forma. No entanto, o impacto já é sentido, pois são países populosos e podem afectar a economia regional. Ainda não sabemos o efeito exacto, mas essas relações continuarão, provavelmente. A preocupação é com os três países, pois são nações sem acesso directo ao mar. Acredito que eles terão a necessidade vital de manter essas relações para suavizar as suas trocas comerciais com o exterior.
Afirmou que "esta é uma lição para a CEDEAO". De que forma a comunidade pode recuperar sua influência? Ou será que esta crise representa um declínio irreversível?
Depende de como a situação for gerida. Penso que a CEDEAO tentou dialogar, mas talvez não tenha havido um diálogo suficientemente profundo para analisar a situação e encontrar soluções. A CEDEAO, para continuar a ser uma organização sub-regional relevante, deverá reflectir profundamente e traçar estratégias para que situações semelhantes não se repitam. Caso contrário, haverá desmoronação. Espero que a organização possa sentar-se e reflectir sobre a situação, encontrando formas de trabalhar com os países membros para que as questões que afectam individualmente cada país possam ser discutidas de maneira colectiva. A CEDEAO deve concentrar-se em como contribuir para a solução dos problemas.
Outra questão que a CEDEAO precisa resolver é a autonomia, especialmente a autonomia financeira. Uma organização que depende de 60% a 70% de financiamento externo enfrenta dificuldades para intervir de maneira efectiva e encontrar soluções. Essas limitações financeiras representam um bloqueio, e organizações continentais como a CEDEAO e a União Africana devem reflectir sobre isso. Só assim podem vir a ter uma intervenção mais robusta em termos de soberania e autonomia. Caso contrário, estarão sempre dependentes de apoios externos, o que enfraquece as suas acções.
Refere-se a essa dependência de financiamento externo. De que forma a aproximação do Mali, Burkina Faso e Níger a países como a Rússia, Turquia e Irão pode influenciar o equilíbrio geopolítico da região?
Inicialmente, não vejo como solução abandonar um parceiro e simplesmente se voltar para outro,...
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RDC: "A comunidade internacional já deveria ter condenado o Ruanda"
1/28/2025
O leste da República Democrática do Congo está a ser palco de violentos combates entre os rebeldes do M23, apoiados pelo Ruanda e o exército regular congolês. Há relatos que dão conta de que partes da cidade de Goma, capital da província do Norte Kivu, estão agora nas mãos deste grupo rebelde. Até ao momento, pelo menos 17 pessoas morreram e quase 400 ficaram feridas.
Em entrevista à RFI, Osvaldo Mboco, analista político angolano começa por relatar-nos aquilo que se sabe até ao momento sobre a situação no terreno, defendendo que a comunidade internacional já deveria ter condenado o Ruanda.
RFI: O que se sabe até ao momento sobre a situação no terreno?
Osvaldo Mboco: O que se sabe é que o M23 tomou de assalto Goma, que é uma das cidades importantes no leste da RDC. Também se sabe que muitos soldados ou militares do exército regular foram capturados pelo M23 e há algumas imagens que ainda são um pouco confusas, que têm a ver com alguns soldados da República Democrática do Congo estarem a ser escoltados pela força regular do exército do Ruanda. Mas ela é muito confusa do ponto de vista de análise e também dos fatos. Agora, um outro elemento que é importante é que Angola, a República Democrática do Congo, e também a República do Congo, acabaram retirando desta região os militares que estavam no mecanismo de verificação da trégua, que existia, também por segurança, penso eu.
Foi decisão de Angola que, segundo notas do país, foi uma acção concertada entre os serviços diplomáticos, quer do Estado angolano, quer com a RDC e quer também com o Ruanda. Está a viver-se um período de muita incerteza ao nível do Leste da República Democrática do Congo. E estas incertezas têm estado a criar um fluxo de refugiados bastante acentuado e também a dificultar a ajuda humanitária. Há uma demonstração clara de força do M23, do ponto de vista de maior capacidade combativa no terreno, comparativamente, com o Exército regular, da República Democrática do Congo, e isto remete-nos a algumas reflexões: se o 23 vai simplesmente parar por goma ou se a intenção do M23 é também ocupar novas áreas, para além de Goma.
RFI: Concretamente, pergunto-lhe qual é o papel estratégico desta que é a principal cidade do Leste da RDC?
Osvaldo Mboco: Esta é uma das regiões que possui maior número de minerais da República Democrática do Congo. Logo, se o M23 controla Goma, quer dizer que vai dar início ou vai intensificar as suas acções do contrabando de mineiros e, por outro lado, isso dará ap M23 maior recurso financeiro para a aquisição de meios, equipamento bélico, etc. E há aqui uma outra perspetiva que não se fala muito, que talvez seja um pouco arriscada também. É mesmo a intenção do M23 querer controlar Goma e fazer de lá surgir um novo estado. Também pode ser aqui uma nova abordagem, que não é muito clara ainda.
RFI: O que é que pode explicar o regresso do M23 a Goma, 12 anos depois de lá ter saído?
Osvaldo Mboco: O que pode explicar é que o M23 nunca viu os seus interesses salvaguardados porque eles pretendem negociar directamente com o governo congolês. Não querem que seja negociado do ponto de vista práctico, por uma terceira pessoa ou então por uma terceira entidade. Mas o grande objectivo do M23 é também ocupar um pedaço de terra e não está muito interessado na paz porque a paz acabaria por obrigar a reintegrar alguns militares no exército. Uns iam para a vida civil, outros seriam desmobilizados, etc. E não é este o cenário porque eles percebem que pela via da guerra eles conseguem pilhar recursos e também defender os seus interesses económicos.
Agora, o regresso está no facto de a comunidade internacional, a República Democrática do Congo, a SADEC e a CIAC pensaram que depois do desaparecimento do M23, o M23 seria extinto e teria menos capacidade combativa. Penso que um elemento que nós temos que discutir é como é que o M23 se rearmou. Acho que deve ser o ponto de partida também do debate que nós temos que fazer.
E M23 reearmou-se em função de...
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80 anos da Libertação de Auschwitz: "Neste dia assinala-se a matança dos judeus”
1/27/2025
Assinala-se nesta segunda feira, 27 de Janeiro, os 80 anos da libertação de Auschwitz. Mais de 1,1 milhões de pessoas foram assassinadas neste campo de concentração e os historiadores afirmam que a maioria, cerca de 1 milhão, eram judeus. Miriam Assor, jornalista, autora e membro da comunidade judaica de Lisboa, afirma que neste dia se assinala a “matança dos judeus” e revela que "apesar da neutralidade portuguesa na II Guerra Mundial, houve portugueses que morreram nos campos de concentração".
Qual é a importância desta data para a comunidade judaica?
Neste dia 27 de Janeiro - dia em que tropas soviéticas entraram finalmente em Auschwitz - assinala- se uma matança, uma tentativa de genocídio direcionado ao povo judeu. Foram assassinadas 1,5 milhões de pessoas, em Auschwitz, sendo que a esmagadora maioria eram judeus.
Porquê os judeus? Porque o Holocausto e a Segunda Guerra Mundial foram direccionadas para o extermínio dos judeus. Depois houve as excepções. Refiro-me aos comunistas, homossexuais, testemunhas de Jeová, ciganos, excepções infelizes que o nazismo também encontrou como alvo de matança.
A matança, a Shoah é direcionada ao povo judeu. É uma coisa que é injustificável. Foi uma tentativa de acabar com os judeus.
Os sobreviventes de Auschwitz falam deste campo como um lugar de desumanização. Esta desumanização é um desafio transgeracional? Qual é que é o processo de cura?
A Desumanização de Auschwitz é algo que me perturba e no qual penso sempre que escrevo sobre esse tema. Não bastava matar, era preciso tirar, aliás tirar-nos – porque também me incluo - a alma das pessoas.
As pessoas chegavam a Auschwitz em comboios de animais e eram selecionadas. Essas pessoas, selecionadas para não viver, entravam num corredor de desumanização. Não sei que género de humano é capaz de fazer isso, mas como dizia Hannah Arendt [filósofa política alemã de origem judaica, uma das mais influentes do século XX] eram pessoas normais e apenas obedeciam a ordens.
Como se faz o processo de cura?
A minha cura é escrever livros.
Qual é o papel da literatura neste processo?
Cada vez que eu escrevo sobre a Segunda Guerra Mundial ponho em prática a expressão “nunca mais”. É através da escrita que luto para que nunca mais [a história se repita]. Escrever com factos, não faço romances, vou aos arquivos pesquisar e mostro a verdade.
Em Julho do ano passado, a Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia alertou para o facto de os casos de antissemitismo terem aumentado em todo o bloco europeu. Algumas organizações, em toda a União Europeia, relataram um aumento de 400% nos incidentes antissemitas, após a resposta militar israelita aos ataques do Hamas de 7 de outubro de 2023. Numa sociedade cada vez mais polarizada, o combate é mais difícil?
O combate hoje é difícil, porque o antissemitismo é uma doença mental. Ninguém que tenha a massa encefálica acinzentada pode ser antissemita, xenófobo, o que quer que seja.
O antissemitismo é um mal ancestral que já existe há uns quantos anos, mesmo séculos e que acompanha a evolução dos tempos. Hoje em dia, parece-me que está muito mais intensivo porque os meios são mais intensivos e, portanto, o antissemitismo existe.
Porque é que não se gosta de judeus? Não lhe sei explicar. Não sei a razão, não faço ideia qual é. Mas sei que pode rimar um pouco com coisas que depois culminaram, por exemplo, na Inquisição [um tribunal formado pela Igreja Católica para condenar e punir as pessoas que tinham desvios nas normas de conduta].
A Inquisição foi um meio antissemita brutal que tínhamos que deixar ser judeus porque senão éramos queimados.
A história, a preservação da memória tem um papel importante na erradicação destes comportamentos?
Sim. Julgo que têm um papel importante,
Portugal foi um país neutro durante a Segunda Guerra Mundial. No entanto, na sua recente investigação que consta do livro “Portugueses na Lista Negra de Hitler” revela que essa neutralidade não foi assim tão óbvia e que...
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Alberto Neto: "Os angolanos estão lá", a combater pela Rússia contra a Ucrânia.
1/24/2025
O envolvimento de militares angolanos a combater pela Rússia contra a Ucrânia, a ideia Pan-africanista de unir Angola e RDC para fazer um único país ou a ausência de democracia em Angola, são alguns temas abordados por Alberto Neto na entrevista à RFI.
António Alberto Neto foi membro do Bureau Político e do Comité Central do MPLA, e é o autor da bandeira do partido de onde saiu em 1973 em protesto contra "a formação de uma elite de corruptos e radicais".
Antes de abandonar o partido, foi nomeado pelo Presidente Agostinho Neto, seu tio, como representante do MPLA nos países nórdicos.
Missão durante a qual conseguiu apoios importantes para a luta dos movimentos de libertação nas ex-colónias portuguesas. Após o 25 de Abril de 1974 regressa a Luanda. Foi o primeiro decano da Faculdade de Direito da Universidade de Angola. Mas, no fim de 1975 foi exonerado e proibido de dar aulas ou exercer cargos de chefia.
Em 1991 fundou o Partido Democrático Angolano (PDA). Concorreu às eleições presidenciais de 1992 e foi o 3º candidato mais votado, mas o partido foi, entretanto, ilegalizado. Por ser abertamente averso ao sistema de partido único, foi preso em diferentes períodos da história angolana.
Aos 81 anos de idade, Alberto Neto olha a câmera fotográfica, levanta o punho, faz o "V" de vitória e continua a luta pela democracia em Angola.
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Forúm de Davos: Adesão plena de Timor-Leste à ASEAN prevista para Maio
1/24/2025
O Presidente de Timor-Leste, José Ramos Horta, participou no Fórum Económico Mundial de Davos, destacando a importância da digitalização para a juventude timorense e a adesão do país à ASEAN. A adesão plena de Timor-Leste à ASEAN é "uma prioridade", afirmou José Ramos Horta, ressaltando os benefícios da integração à economia e diplomacia regional, que vão fortalecer a voz do país numa organização com uma população jovem e crescente.
Esta é a sua segunda participação no Fórum de Davos. Qual é o interesse em se deslocar a este evento?
José Ramos Horta: Creio que esta é a minha quarta participação: participei no início da independência de Timor-Leste, enquanto ministro dos Negócios Estrangeiros. Depois, participei em 2014, quando era representante especial do secretário-geral da ONU para a Guiné-Bissau e depois, em 2023, já como Presidente e agora de novo. A evolução da situação mundial é óbvia, para melhor nalgumas áreas, como a digitalização e a inteligência artificial. Mas, noutras áreas, obviamente, em outra dimensão, muito grave. Começamos em 2020 com a pandemia, com grande impacto nas economias nacionais, um empobrecimento ainda maior dos já pobres, recursos catastróficos em relação aos progressos registados na luta contra a pobreza, e depois, como se isso não bastasse, têm havido grandes catástrofes naturais, inundações graves, incluindo no meu país, dois anos seguidos, inundações e incêndios graves que quase se tornaram um fenómeno anual.
Como se tudo isto não bastasse, a Rússia decidiu invadir a Ucrânia, e isso impactou não só a Ucrânia em si e a própria Rússia, mas também impactou a economia mundial, com a subida dramática dos preços de produtos de consumo de primeira necessidade, sobretudo nos países em vias de desenvolvimento. Temos agora a eleição do Presidente Donald Trump, o que oferece algumas perspectivas positivas, talvez, vamos ver, e outras que levantam profundas preocupações.
Donald Trump começou o seu discurso, de ontem, a convidar os empresários presentes em Davos a produzirem nos Estados Unidos. Esta é uma declaração que vem confirmar esta política proteccionista norte-americana.
Exacto, mas é natural, obviamente, convidar investidores a investir nos Estados Unidos. É óbvio que qualquer país faz isso, e os Estados Unidos oferecem condições que muitos outros não oferecem. É um mercado riquíssimo, que dá muitas facilidades aos investidores. A economia americana continua forte, o desemprego quase inexistente. Embora os Estados Unidos tenham graves problemas sociais, como milhões de pessoas sem casa, milhões de pessoas a viver em extrema pobreza e violência em muitas cidades americanas. Mas violência a sério, não é um mar de rosas.
Mencionou a importância da adaptação à tecnologia, à inteligência artificial para a população jovem de Timor-Leste nesta participação em Davos. De que forma o governo do seu país está a acompanhar esta transformação digital?
Estamos a acompanhar e, creio, este ano haverá grandes progressos. O cabo submarino que nos liga à Austrália e a outros países do mundo está em vias de conclusão e de entrar em funcionamento. Estamos ligados ao Starlink. As infraestruturas básicas estão a decorrer. Vamos dar um grande salto em frente neste domínio. Os jovens timorenses têm muita inclinação para a área de ciências, tecnologia e informática. Temos cada vez mais timorenses a viver no exterior, na Austrália, na Coreia do Sul, na China, claro, no Reino Unido, em Portugal.
Durante esta sua participação na sessão sobre a Associação das Nações do Sudoeste Asiático, saudou o trabalho da organização e perguntava-lhe sobre o roteiro implementado pela ASEAN para adesão plena de Timor-Leste vai acontecer em Maio?
É uma prioridade absoluta para nós. A adesão à integração plena na economia regional e na diplomacia regional deve acontecer em Maio e vai elevar a voz de Timor-Leste dentro de uma organização que tem cerca de 700 milhões de pessoas, muito maior que a União Europeia e quase todo o...
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"Davos não deixa de ser um supermercado de ideias"
1/23/2025
O Fórum Económico Mundial de 2025, em Davos, reúne mais de 3000 líderes para discutir questões geopolíticas, económicas e tecnológicas. A ministra do Ambiente e Energia de Portugal, Maria da Graça Carvalho, participa no fórum sob o tema "Colaboração para a Era Inteligente", destacando a urgência de usar inovações tecnológicas de forma ética para enfrentar desafios globais.
RFI: O que se pode esperar da edição deste ano do Fórum Económico em Davos?
Maria da Graça Carvalho: A nossa participação, a participação portuguesa, tem sido muito útil. Eu, como ministra com a pasta da Energia, levei a mensagem de que Portugal é um país com uma quantidade abundante de energias renováveis a preços acessíveis. Estamos com um plano ambicioso de produção de hidrogénio de origem renovável, o que nos torna um país seguro e estável. Estas políticas de energia têm o apoio dos maiores partidos, tanto do governo quanto da oposição. Como foi demonstrado agora no Parlamento, com a aprovação praticamente generalizada do Plano Nacional de Energia e Clima para 2030. Portanto, Portugal é um país que tem todas as condições para atrair investimento, tanto na produção de energias renováveis quanto nas indústrias que precisam utilizar essa energia, especialmente o hidrogénio. Temos condições mais favoráveis do que vários países da Europa Central e do Norte, que durante muitos anos, na anterior Revolução Industrial, eram muito baseados no carvão e no petróleo, recursos dos quais Portugal não dispõe. Mas, neste momento, somos nós, no sul da Europa, que temos essas condições. Combinamos sol, vento e também energia hídrica. Temos uma grande quantidade de energia hídrica. Aliás, no ano passado, 71% da nossa electricidade foi de origem renovável. A energia renovável com maior percentagem foi exactamente a hídrica, com 28%, seguida da eólica com 27%, solar e biomassa. Portanto, temos condições únicas ao combinar a hídrica, que são as barragens, com o vento, com o sol e com toda a vontade política de atrair o investimento. E para isso, estamos a fazer um grande esforço de simplificação dos procedimentos, sem ser menos rigorosos, porque somos rigorosos do ponto de vista ambiental, mas sendo mais rápidos a decidir e com processos mais simples, de modo a criar um bom ambiente para o investimento tanto nacional quanto estrangeiro.
Portugal atingiu 71% de energias renováveis na produção eléctrica em 2024, como dizia a senhora ministra, e tem como meta alcançar 93% em 2030. Pela primeira vez na história do Fórum Económico Mundial, em Davos, as alterações climáticas aparecem no topo das maiores preocupações dos empresários e dos líderes das maiores economias do mundo. Portugal está a fazer a sua parte na transformação energética, mas é um esforço que deve ser global?
Sim, é um esforço que deve ser global, exactamente porque é um fenómeno global. A Europa representa cerca de 7% das emissões globais e, mesmo que se reduzam completamente as emissões na Europa, o efeito será de escala mundial. Portanto, não se consegue alterar o rumo das coisas se não for com o esforço de todos. Mas eu penso que é algo que, principalmente com os eventos dos últimos um ou dois anos, levou a uma consciência muito grande das pessoas, das empresas, das cidades, dos presidentes de câmara. E, portanto, acho que é um percurso irreversível. Todos têm consciência de que o ambiente é fundamental para a qualidade de vida, para a saúde, mas também para a economia. É um factor de competitividade ter um país com ar puro, boa qualidade da água, com um ambiente com espaços verdes que emitem pouco CO2 e com poucas emissões, ou reduzindo ao máximo as emissões que perturbam a qualidade do ar. E isso é um valor que não é só um valor para o ambiente, não é só um valor para a saúde humana, é também um valor económico. Os países mais ricos do mundo são países que têm muita atenção às questões ambientais.
Esteve reunida com a sua homóloga espanhola. É importante esta colaboração com a Espanha no mercado...
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“Israel mantém pressão para tirar partido das negociações que vão ser difíceis”
1/22/2025
Depois da trégua em Gaza, Israel lançou uma operação na Cisjordânia. Pelo menos oito pessoas foram mortas e dezenas ficaram feridas num ataque israelita ao campo de refugiados de Jenin. Kamel Abu Rab, governador de Jenin, fala em "invasão" do campo de refugiados. Já o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, afirma que se tratou de uma operação antiterrorista contra o "eixo iraniano". Vítor Ramon Fernandes, professor auxiliar na Universidade Lusíada de Lisboa e professor adjunto da Sciences Po Aix en Provence, afirma que devido à fragilidade do cessar-fogo, Israel está a manter pressão para tirar partido das negociações que vão ser extremamente difíceis.
O que procura o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, com esta operação na Cisjordânia?
Toda a questão palestiniana é uma questão que continua a ser importante para Israel. Ou seja, no sentido de manter a pressão e também tirar partido da posição de força, em que Israel se considera, para as negociações que vão ser extremamente difíceis. Estamos na presença de um cessar-fogo em Gaza, que não é na Cisjordânia, extremamente frágil. Vamos ver como é que termina toda esta situação.
Benjamin Netanyahu pode estar também a tentar salvaguardar a coligação, que o mantém no poder, após a saída dos três ministros da extrema-direita?
Esse aspecto é muito importante. Está ligado a toda esta questão, não só da Cisjordânia, mas mesmo da Faixa de Gaza. Muito do que vai acontecer, relativamente à primeira fase do acordo de cessar-fogo, vai depender da política interna de Israel.
O primeiro-ministro israelita tem de facto aqui umas fragilidades internas. Por um lado, há uma ameaça por parte da coligação dos elementos mais extremistas, já tivemos aqui a demissão de três ministros, que ainda não põem em causa a manutenção do Governo, mas a prazo pode acontecer. Por outro lado, isto é uma forma do primeiro-ministro, no fundo, demonstrar que está a pôr uma pressão na questão de Gaza e da Palestina, mostrando-se de alguma forma fiel aos elementos da coligação e às suas preocupações.
Em Telavive, quatro pessoas ficaram feridas num ataque com uma arma branca nesta terça-feira, 21 de Janeiro. O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, disse estar preocupado e pediu a Israel para exercer a máxima contenção, usando a força letal apenas quando for absolutamente inevitável para proteger vidas. Estes episódios, na Cisjordânia e em Telavive, podem pôr em causa o cessar-fogo?
Claramente. O cessar-fogo já está muito frágil, não só pelas questões ligadas a Gaza, mas todos estes elementos - que acabou de referir- são elementos adicionais. A primeira fase do acordo de cessar-fogo tem uma parte muito importante que tem a ver com a retirada das tropas de Israel de Gaza. Este vai ser um elemento fundamental. Porque, de facto, neste momento, temos um Hamas enfraquecido, mas que não está acabado. O Hamas vai aprovisionar-se e a retirada de tropas israelitas pode, de alguma, forma facilitar isto, em particular na parte sul de Gaza.
Relativamente à retirada das tropas israelitas de Gaza, porque não acredito na retirada do corredor de Filadélfia [exigências dos palestinianos] isso colocaria em causa e fragilizaria os objectivos estratégicos de Israel. Israel nunca vai abandonar estes objectivos e de certeza que vai ter a mesma postura no que se refere a Gaza. Porém, estes factores podem, com toda a probabilidade, pôr em causa o cessar-fogo e o acordo está na primeira fase. Ainda não chegamos à segunda.
Todos os acontecimentos que se passem no interior de Israel, no fundo, são elementos que são mais próximos ao povo israelita e, portanto, que dão a justificação ao Governo de Israel e ao primeiro-ministro para que se tomem determinadas acções. A questão da política interna e das acções que ocorrem em Israel é também determinante para o que venha a acontecer no futuro, relativamente a este acordo.
Até mesmo na libertação de reféns. O Hamas vai libertar quatro reféns israelitas,...
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"Para os Estados Unidos de Donald Trump, África não é uma prioridade"
1/21/2025
Donald Trump tomou posse como 47.º Presidente dos EUA, levantando incertezas quanto à política externa, especialmente com o continente africano. No seu primeiro mandato, Trump mostrou pouco interesse pelo continente africano. O docente da Escola Superior de Relações Internacionais da Universidade Joaquim Chissano, Calton Cadeado, acredita na manutenção do status quo nas relações EUA-África e observa a saída dos EUA da OMS e do Acordo de Paris como um reforço da postura unilateral de Donald Trump.
RFI: Donald Trump descreveu o início da sua gestão como uma "era dourada", prometendo apostar na prosperidade americana. Por outro lado, diversos líderes africanos manifestaram interesse em fortalecer os laços com os EUA, destacando esperanças em parcerias económicas e cooperação mútua. O que se pode esperar das relações entre os Estados Unidos e o continente africano nos próximos quatro anos?
Calton Cadeado: À primeira vista, é esperar mais do mesmo. Não há grandes alterações. Uma grande evidência disso é o número de convidados africanos que não estão presentes nos eventos presidenciais. Isso já diz algo, porque a África nunca foi uma prioridade para os Estados Unidos sob a liderança de Donald Trump. Isso ficou ainda mais explícito no passado, e não há muita expectativa de que isso venha a mudar.
Em que medida a política de Donald Trump pode travar o desenvolvimento e as relações entre os Estados Unidos e a África?
Não vejo possibilidade de travar as relações entre os Estados Unidos e a África. Vejo uma continuidade do que já está em curso. Por isso digo: mais do mesmo. Há, por exemplo, algum receio de que projectos como o corredor do Lobito, em Angola, sejam interrompidos. Mas não acredito que os Estados Unidos abandonarão a política de apoio a questões de saúde, por exemplo. Também não vejo os Estados Unidos a desistirem de alargar a sua presença no continente africano por meio do AFRICOM, algo que, apesar de difícil de concretizar, continua relevante. Além disso, abandonar completamente o continente africano significaria abrir espaço para a China e a Rússia, que estão activamente à procura de fortalecer as suas influências.
Mas quando Donald Trump anuncia a saída dos Estados Unidos da Organização Mundial da Saúde (OMS), isso terá inevitavelmente consequências à escala global, mas também para o continente africano?
De facto, essa saída simboliza um ataque ao multilateralismo, algo que já se esperava de Donald Trump. No entanto, é importante considerar o lado bilateral das relações, que ele provavelmente vai tentar manter. Sair completamente seria uma tragédia para as ambições geopolíticas americanas. Por outro lado, Trump pode simplesmente ignorar políticas que Joe Biden implementou e que foram bem recebidas em África, como a defesa de uma maior presença africana no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Essa é uma questão que Donald Trump provavelmente não discutirá, como já ficou evidente nos seus discursos. Outro aspecto importante são as cimeiras entre os Estados Unidos e a África, cuja realização permanece incerta. Mas, se não acontecerem, não será uma surpresa, pois já é o que se espera de Donald Trump.
O que pode acontecer caso essas cimeiras não se realizem nos próximos quatro anos?
Está claro que, para os Estados Unidos sob Donald Trump, a África não é uma prioridade. A menos que algo extraordinário aconteça no continente, Trump dificilmente gastará recursos em iniciativas como as cimeiras EUA-África, especialmente se essas acções não trouxerem benefícios económicos directos para os Estados Unidos.
Em que medida, China e Rússia podem capitalizar um possível recuo dos Estados Unidos no continente africano?
Quando Joe Biden fez a visita histórica a Angola, no contexto do corredor do Lobito, muitos interpretaram isso como um colapso da influência russa em África. Contudo, a Rússia, devido à guerra na Ucrânia, enfrenta dificuldades económicas e políticas que limitam a sua acção no continente. Já a China parece...
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"Donald Trump vai ser essencialmente um Presidente para Elon Musk, Jeff Bezos e Mark Zuckerberg"
1/20/2025
Donald Trump toma posse hoje como 47º Presidente dos Estados Unidos da América e a incerteza paira sobre Washington - e sobre o Mundo - sobre as suas prioridades. Desde a deportação em massa dos imigrantes ilegais, redução dos apoios às renováveis e potencial expansão do território, João Pedro Ferreira, investigador na Universidade da Vírginia considera que Trump será um Presidente para os super ricos e fará o que beneficiar as grandes empresas norte-americanas.
Donald Trump regressa hoje à Casa Branca, mas apesar de já ter cumprido um mandato entre 2017 e 2021, a incerteza sobre as suas acções marcará os primeiros 100 dias de mandato. Por um lado porque o novo Presidente já multiplicou as promessas megalomanas ligadas à deportações de milhões de imigrantes ou a um novo encerramento das fronteiras, do outro porque apesar de os republicanos deterem a maioria no Congresso, não é claro que estas polémicas medidas agradem a todos os conservadores - já que vão perturbar em larga a escala a economia norte-americana.
"Ninguém sabe como vão ser os primeiros 100 dias de Donald Trump, nem ele próprio, porque nos Estados Unidos o sistema é presidencialista, um bocadinho como em França, mas com algumas diferenças. Trump, para ser eleito, representou uma coligação muito grande de diferentes interesses. E ao representar uma coligação muito grande, de diferentes interesses, o que vemos agora é que as pessoas que estão a tomar posse na Casa Branca, muitas delas são novas no cargo ou basicamente não sabemos muito bem o que é que podemos esperar delas. Para se perceber, quem vai ficar com a questão interna dos militares é uma pessoa que era jornalista na Fox News. Ora bem, nada contra jornalistas, mas ele, de facto desconhecido qualquer tipo de experiência associada ao cargo que está a ter. Por exemplo, a pessoa que vai ficar com o ambiente é uma pessoa ligada à indústria do carvão. Ora, isto não é propriamente novo nos Estados Unidos e, em particular, isto já aconteceu no primeiro mandato Donald Trump. Mas torna tudo um bocadinho incerto", indicou João Pedro Ferreira, economista e investigador de Políticas Públicas na Univerdade da Virgínia, nos Estados Unidos.
Se o gabinete de Donald Trump tem causado polémica desde que os primeiros nomes começaram a ser apontados, especialmente no que diz respeito a Pete Hegseth, Secretário da Defesa, outros nomes não surpreenderam como do multi-milionário - e agora homem mais rico do Mundo -, Elon Musk, que ficará encarregue do posto de Eficiência Governamental. É aliás para o perfil de Elon Musk e de outros super ricos, que João Pedro Ferreira pensa que Trump vai governar.
"Eu tenho poucas dúvidas que Donald Trump, apesar do que disse, é um Presidente para os oligarcas, para os grandes senhores como Elon Musk, Jeff Bezos e Mark Zuckerberg, que já começaram todos a posicionar-se face a Donald Trump. Foi conveniente e infelizmente o discurso de ódio foi abraçado por um conjunto de gente da extrema-direita e cristão nacionalistas, mas ele dificilmente terá um discursos e uma postura que vai agradar a todos", afirmou o académico português radicados nos Estados Unidos.
Se os americanos de classe média esperavam grandes alterações quanto ao custo de vida ou oportunidades de emprego graças à subida ao poder de Donald Trump, o próprio Presidente já veio dizer que os preços não vão diminuir - ao contrário do que disse durante a campanha. Mesmo na oposição à China, um ponto essencial na sua dialética para aceder ao poder e prometer um futuro económico mais favorável, Trump deve "falar grosso e fazer pouco", como apontou João Pedro Ferreira.
Na esfera internacional, Trump até poderá ter sucessos, colhendo os frutos do cessar-fogo negociado entre Israel e o Hamas e até pode chegar a mediar um entendimento entre a Rússia e a Ucrânia, mas beneficiará mais dos erros cometidos durante a administração Biden do que terá uma intervenção directa no fim desses conflitos.
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“A diversificação económica vai mudar o paradigma de Angola”
1/17/2025
O ministro angolano das Relações Exteriores, Téte António, integrou a delegação do Presidente João Lourenço durante a visita de dois dias a Paris, capital francesa. Em entrevista à RFI, o responsável pela diplomacia angolana fez o balanço desta viagem de 48 horas, sublinhado que a diversificação económica vai mudar o paradigma de Angola.
Que peso tem esta visita para a diversificação da economia angolana? Uma promessa antiga do Presidente João Lourenço, que tarda a fazer sentir-se no país.
Não, eu não diria isso, que é uma promessa que tarda, porque o desenvolvimento é um processo. Portanto, nós não podemos medir o horizonte temporal do desenvolvimento. A razão pela qual, países ditos desenvolvidos, continuam desenvolver-se. Para nós, essa lógica também é válida. Temos estado a trabalhar para [esse desenvolvimento], tratando com todos os nossos parceiros, incluindo talvez o parceiro actual, que é a República Francesa que estamos a visitar.
Portanto, é um processo que está em contínuo. E temos estado a trabalhar para o efeito, porque acreditamos que a diversificação é o que vai mudar o paradigma.
É essa parceria que Angola quer com a França?
Com certeza. Portanto, a implicação dessas empresas francesas é também para nos diversificarmos com a França. Nós falamos da diversificação económica também para diversificar a parceria. Se olharmos para a nossa cooperação com França, o sector petrolífero tem um grande peso, mas queremos fazer com que essa parceria seja diversificada para outros domínios.
Como é o caso da agricultura, saúde, água e energia?
Sim, e também no domínio da formação. O instituto que está em Malanje, no ramo da agricultura, foi feito com cooperação francesa. Essa diversificação de que estamos a tratar é um processo que nasceu depois da nossa independência e que o Presidente João Lourenço continua a dar a sua contribuição para o efeito.
De que forma é que estes projectos que foram anunciados, 430 milhões euros em financiamento de contratos, vão ter impacto na vida dos angolanos e das angolanas?
Se falarmos do domínio que acabamos de citar, sobre a produção agrícola e para um país com uma população que continua a crescer - a soberania alimentar é um ponto essencial. Como dizia Agostinho Neto [Presidente do MPLA e em 1975 tornou-se o primeiro Presidente de Angola até 1979] o saco só fica de pé quando está cheio. A soberania alimentar é um ponto crucial para qualquer país que queira desenvolver-se. E isto não se pode ser resolvido com as importações, deve fazer-se com a produção local.
O senhor ministro assinou com o seu homólogo francês, Jean-Noël Barrot, um memorando para lutar contra o terrorismo, a criminalidade, tráficos de seres humanos, imigração ilegal. De que forma é que se vai traduzir este memorando? Qual é que será a sua aplicação?
A luta contra a criminalidade, justamente, tem uma natureza que é talvez o domínio que mais precisa de cooperação, porque nenhum país- hoje- pode fazer face ao terrorismo, sozinho ou sem a parceria de outros países. Foi essa razão que levou Angola a propor a realização de uma cimeira extraordinária da União Africana sobre o terrorismo que teve lugar em Malabo.
Temos feito não só na teoria, mas também na prática, na relação que temos com os outros, porque o crime sofisticou-se de tal forma que só a troca de informações e de conhecimentos pode fazer face a esse fenómeno- o terrorismo- que afecta muitos dos nossos países. O continente africano, a região do Sahel e Moçambique vivem confrontados com esse flagelo. Penso que é uma luta do mundo e Angola não pode ficar indiferente a este desenvolvimento.
Durante esta visita falou-se no conflito que opõe a RDC ao Ruanda. O que é que os dois chefes de Estado falaram sobre esta questão? O que foi decidido?
Não se trata de decidir. Trata-se, sim, de trocar impressões para ver quais são os esforços que devem ser feitos e onde os países podem complementar-se. Na procura de uma solução para este conflito que afecta a RDC, tendo...
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RDC/Ruanda: "Não me parece que a resolução do conflito passe pela mediação de Angola"
1/16/2025
O Presidente de Angola, João Lourenço, inicia nesta quinta-feira, 16 de Janeiro, uma visita de Estado de 48 horas a França a convite do homólogo Emmanuel Macron. Para além da cooperação bilateral, os dois estadistas devem abordar os conflitos políticos no continente africano, nomeadamente a crise entre a RDC e o Ruanda. O sociólogo angolano, David Boio, não reconhece os ganhos da diplomacia de João Lourenço e mostra-se céptico quanto à mediação angolana no conflito que opõe a RDC ao Ruanda.
A presidência francesa reconhece “os esforços de Angola” ma mediação do conflito que opõe a RDC ao Ruanda. Que análise faz da mediação angolana?
Penso que a nível da presidência pode-se ter colocado muitas expectativas no sucesso desta mediação, inclusive quando atribuíram a João Lourenço o título de Campeão da Paz. Não me parece que a resolução do conflito passa por essa mediação. É preciso saber que nestes processos há questões práticas, o Presidente João Lourenço nem sequer fala francês, nem inglês. Como é que são feitas essas mediações do ponto de vista prático?
A verdade é que até hoje não houve grandes progressos. Quando os rebeldes do grupo M23 tomaram de assalto a cidade estratégica de Masisi, a presidência de Angola fez um comunicado a reprovar esta acção, mas isso não teve consequências. Eu penso que o que Angola, em termos de conflitos, aprendeu é que os conflitos devem ser resolvidos pelos intervenientes. Tudo quanto é mediação ajuda, mas se não existir vontade própria dos actores e dos intervenientes será muito difícil que se criem grandes resultados.
João Lourenço realiza esta visita a França enquanto Presidente de Angola, mas também como futuro presidente da União Africana. Qual é que será o papel de Angola na presidência União Africana, nomeadamente na mediação de outros conflitos, como, por exemplo, o do Sudão, a situação política que se vive em Moçambique?
A União Africana é uma organização complicada. Por exemplo, no caso de Moçambique, não há dúvidas do tipo de eleições que houve no país, mas este tipo de eleições não são diferentes do tipo de eleições que são feitas em Angola. Assim sendo, não há autoridade moral, nem política para se imiscuir nos assuntos dos outros países.
Agora, a questão é que nós temos em África, infelizmente, uma espécie de coligação entre líderes autoritários e que implementam essa agenda autoritária. Por isso, afirmar-se que vai haver um impacto de Angola para qualquer outra coisa que não seja a perpetuação do autoritarismo nesses países, acho muito difícil.
Angola é um Estado autoritário. João Lourenço é líder de um país autoritário, todo o resto é fácil de perceber o que daí pode vir. Depois é preciso compreender que as relações entre os países africanos são complicadas. João Lourenço prefere deslocar-se a França do que ir a Moçambique para participar na tomada de posse de Daniel Chapo. Não sabemos bem o porquê, nem sabemos tão pouco os resultados desta viagem. O próprio Emmanuel Macron mantém, actualmente, relações difíceis com os países do Sahel.
Considera que as autoridades francesas poderão aproveitar esta visita de João Lourenço para mostrar que a França consegue manter boas relações com os países africanos?
O que representa João Lourenço para esses países? Não parece que represente grande coisa. Acho que por essa via, não me parece que a França ganhe alguma coisa. Estamos a falar de Estados africanos que são, para todos os efeitos, Estados soberanos e autónomos.
Agora, Angola podia ser mais solidária relativamente aos outros Estados africanos, face a esse clima entre a França e os Estados africanos do Sahel.
Aquilo que sentimos em Angola é que João Lourenço é o Presidente que mais viaja e durante todas essas imensas viagens que faz, o país não tem visto nenhum resultado positivo. João Lourenço diz que viaja para fazer diplomacia económica, mas o país está cada vez menos atractivo do ponto de vista económico.
Não acredita, então, que João Lourenço, na qualidade de presidente...
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"França quer mostrar ao mundo que tem relações fortes com os países africanos"
1/16/2025
O Presidente de Angola, João Lourenço, inicia nesta quinta-feira, 16 de Janeiro, uma visita de Estado de 48 horas a França a convite do homólogo Emmanuel Macron. Esta deslocação vem reforçar os laços entre os dois países, numa altura em que França vê em Angola um parceiro estratégico, tanto no plano económico como diplomático. Em entrevista à RFI, Sérgio Calundungo, coordenador do Observatório Político e Social de Angola - OPSA, afirma que esta visita ocorre num contexto em que Angola procura potenciais investidores e a França quer mostrar ao mundo que tem relações fortes com países africanos.
O que é que se pode esperar desta visita de 48 horas do chefe de Estado angolano, João Lourenço, a França?
As autoridades angolanas tentarão expor as potencialidades com o objectivo de atrair o interesse de potenciais investidores de França. Angola é um país que tem imenso potencial, mas este potencial convive com um cenário de poucos recursos. Há uma necessidade gritante de investimentos para poder alavancar a sua economia. Mas é importante também olhar para o contexto em que esta visita ocorre. Claramente que ocorre num contexto em que a França também quer ganhar alguma influência. Temos assistido um pouco ao que tem acontecido com a França na região do Sahel.
Acha que a França vai aproveitar esta oportunidade também para diversificar os parceiros?
Eu creio que sim. É uma oportunidade muito grande para França sinalizar, pelo menos ao mundo e aos outros atores que ainda tem a oportunidade de ter uma relação fortes, estáveis e de grande proximidade com países africanos em função dos últimos reveses que se verificaram na região do Sahel.
As autoridades francesas apresentam-se como o primeiro investidor em Angola, falam num stock de investimento no valor de 18 mil milhões de euros, principalmente no sector do petróleo. Mas os sectores de que falam vão para além do petróleo. Mostram interesse na energia solar, no sector das infraestruturas, nomeadamente saneamento e minerais estratégicos. Que tipo de cooperação se pode esperar nestes sectores?
É claramente importante porque vai ao encontro daquilo que tem sido uma das grandes preocupações da Angola, a diversificação da economia. A França faz parte do leque de países que falam do volume financeiro e do investimento que dedicam ao país, até então muito concentrado no sector do petróleo.
Trata-se de um sector que é intensivo de capitais, mas é um sector que promove muito pouco emprego e não contribui tanto para aquilo que, neste momento, é a grande prioridade de Angola, ou seja, a diversificação da economia. É esse esforço que está a ser feito pelas autoridades angolanas para que os investidores franceses olhem para outras oportunidades, como o sector das energias renováveis, os minerais estratégicos e, por que não, o sector da agricultura.
A França foi o primeiro fornecedor de trigo a Angola em 2023. Em 2018, foram assinados uma série de acordos de cooperação. O que é que se pode esperar em concreto para a agricultura nos domínios da irrigação, apoios à reconstrução, por exemplo, da indústria do café, apoio técnico à agricultura?
Sim, esses apoios são precisos. Para Angola vai ser importante o facto de a França ter um manancial em termos de tecnologia, experiência e de recursos financeiros que são necessários para este sector. A França pode partilhar este conhecimento, sobretudo técnico-científico, que vai ser necessário, porque hoje em dia a agricultura requer também um certo conhecimento técnico e científico.
Qual será o contributo da França no projecto do Corredor do Lobito?
O Corredor do Lobito tem um potencial muito grande e representa uma vantagem económica não só para Angola, mas para os países da região, sobretudo para a RDC e Zâmbia.
Portanto, penso que neste projecto há espaço para todos os investidores. No entanto, sempre que reflito no Corredor do Lobito, concluo que há um entusiasmo muito grande, mas eu gostaria muito que, a par do entusiasmo, também houvesse a noção...
Duration:00:08:58
Daniel Chapo no poder: "vai ser importante criar um ambiente de paz para pôr em marcha o seu plano"
1/15/2025
Foi investido hoje em Maputo Daniel Chapo, como quinto Presidente da República de Moçambique, num contexto político tenso. Declarado vencedor das eleições gerais de 9 de Outubro com um pouco mais de 65% dos votos, o actual secretário-geral da Frelimo tomou posse sob apertado dispositivo de segurança para ele e os seus 2.500 convidados, depois de semanas de violentos protestos liderados pelo seu mais directo adversário, Venâncio Mondlane, com um balanço de cerca de 300 mortos segundo a sociedade civil.
Primeiro Presidente moçambicano nascido depois da independência, Daniel Chapo, 48 anos, era tido até agora como um responsável discreto. Contudo, no seu primeiro discurso como Presidente, quis apresentar-se como um líder de "ruptura".
Ao defender a união no país e "a estabilidade social e política" como "prioridade das prioridades", Daniel Chapo falou no “início de uma nova fase” da “jornada de consolidação” e da construção de uma “nação soberana e próspera”, projectos que deveriam materializar-se, na sua óptica, através de uma ampla reforma do Estado, com a redução do número de ministérios, com a criação de novas entidades, com a digitalização dos serviços públicos e com a luta contra a corrupção.
Um discurso que segundo o analista moçambicano Dércio Alfazema pode encontrar eco junto da população que esteve na rua.
RFI: Dércio Alfazema tem sido considerado até ao momento como sendo um líder discreto. Tem-se colocado em evidência o facto de ele ser o primeiro Presidente nascido depois da independência. Com o discurso de hoje, julga que ele pode personificar a ruptura?
Dércio Alfazema: Esse anúncio de hoje é uma situação praticamente de ruptura e era o que se precisava para se reanimar o Estado. Então, há uma transição geracional, uma nova forma de ver e abordar o Estado. Ele esteve em silêncio de uma forma muito discreta, parece que à espera do momento certo para dizer 'olha, eu estou aqui e é assim como nós vamos avançar'. Portanto, o discurso dele hoje aponta uma direcção clara: reformas profundas de contenção, de transparência. E eu penso que ele é a pessoa certa, exactamente porque não está contaminado com esse ambiente de grupos, de alas que têm essas ligações históricas muito profundas. E essa questão de ruptura e transição já começou a ser feita com o Presidente Nyusi. Não foi combatente, mas ele esteve, cresceu, passou uma parte do tempo com os combatentes. Agora vem o Chapo que não tem absolutamente nenhuma ligação com os combatentes e vem concluir esse processo de transição, de uma forma muito estruturante, muito profunda. Eu penso que ele é a pessoa certa. Estamos no momento certo. A população esteve na rua a clamar por isso, a dizer que queremos mudanças profundas, mais do que uma questão eleitoral. A população quer medidas concretas que mostram um sinal claro do governo de que está em prol da população e não termos uma situação em que a população clama pelo custo de vida, pela falta de acesso às oportunidades, pelos serviços precários, enquanto temos um governo que ostenta cada vez mais que, afinal de contas, não é problema de recurso, é um problema de como são geridos e canalizados os recursos. Então faz essa ruptura de uma forma muito clara e profunda.
RFI: Daniel Chapo chega ao poder num contexto que lhe é hostil. Ainda antes da sua tomada de posse, há uma série de ONGs que depositaram junto da União Africana uma petição reclamando que a União Africana não reconheça Daniel Chapo como Presidente de Moçambique. O que é que se pode dizer sobre esta iniciativa ao fim de várias semanas de crise pós-eleitoral?
Dércio Alfazema: Isto é uma forma de protesto, uma forma de contestação, estamos num contexto democrático. Eu acho que a sociedade civil está a fazer o seu papel, apesar de, em alguns momentos, optarem por caminhos que logo à partida, não vão dar nada para além de aplausos nas redes sociais, para além de uma manifestação de intenção apenas. Mas é a democracia, é aquilo que é permitido. Eu penso que cada um...
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Incêndios em Los Angeles à prova dos ventos fortes
1/14/2025
Na Califórnia, nos Estados Unidos, a área de Los Angeles está a ser palco de violentos incêndios que têm deixado vasto rasto de destruição e, também, mataram pelo menos 24 pessoas.
Guenny Pires é um cineasta a residir na região à qual ele acaba de regressar proveniente de Cabo Verde.
Ele relatar à RFI as imagens que tem testemunhado desde que chegou de volta a Los Angeles.
Guenny Pires, cineasta radicado na região de Los Angeles:
Durante a viagem, o avião passa pelo lado leste de Los Angeles, onde tem neste momento a maior quantidade de fogo. Mas pode-se reparar, durante a caminhada, o percurso do aeroporto para onde estou neste momento... pode-se ver várias destruições, sobretudo no lado do Pacífico.
No lado onde começou o fogo, com muitas destruições, sobretudo com pessoas muito em baixo, com situações bastante delicadas. E muita movimentação de pessoas do corpo do bombeiros e corpo de polícia a tentar fazer de tudo para apaziguar este desastre que infelizmente ainda continua. Com várias dificuldades, sobretudo por causa do vento forte que está a fazer neste momento.
Mas o número de vítimas também aumentou e, além disso, a destruição continua de uma forma incrível e esperamos que melhores momentos, melhores dias possam vir brevemente.
Como trabalho numa universidade Mount Centre Mary's University, que está no lado do Pacífico, esta universidade está fechada.
O Hollywood Studio, onde vou com mais frequência neste momento, suspendeu todas as actividades e tem actividades somente via virtual e de modo que possivelmente na próxima semana pode abrir as portas. É uma situação bastante difícil.
Alguma vez viu alguma coisa assim em Los Angeles?
Não, em 22 anos de vivência, nunca vi. Houve fogos, sim, alguma destruição de algumas comunidades, inclusivamente da estrada, a auto-estrada e algumas situações de destruições em várias localidades.
Mas em Los Angeles esta creio que é mais forte que nos últimos anos já se registou. Mesmo para pessoas que têm 80, 70 anos. Estão a dizer que nunca tinham visto algo assim.
No entanto, é uma zona montanhosa. Há vales e há muito mato que não é limpo nessa região dos vales. Acha que pode ser essa uma das razões que explica o incêndio de tais dimensões?
Sobretudo, fazia referência ao vento. Infelizmente, as previsões apontam para rajadas de vento fortes nas próximas horas, o que pode vir ainda a dificultar mais a tentativa para controlar os incêndios, não é ?
Com certeza. Para quem conhece Los Angeles, sabe que há uma dificuldade grande em manter os vales e ribeiras sem palhas, o que é muito perigoso para este tipo de situação.
Entretanto, eu tive a oportunidade de, no passado, viver em Altadena, onde está neste momento a grande quantidade de fogo, nunca tinha reparado em tanto problema desta ordem. Mas é claro que...
O mato não é limpo, não é?
Não é. Nunca foi, nem as ribeiras. É muito, muito difícil controlar com as situações de mudança de clima, utimamente. E com a subida de temperatura, isso vai-se agravar cada vez mais. É necessário que as autoridades e as pessoas, sobretudo, terem em conta que todos temos de contribuir para que, de facto, a situação possa melhorar. E neste momento é uma situação bastante delicada e não creio que as autoridades vão conseguir encontrar a razão disto. Mas há algumas especulações que foi [fogo] posto. Mas isto não passa de especulações e até provar que é verdade, não sei se vamos ter alguma pista sobre o resto.
E acha que pelo facto de haver gente muito famosa, muito rica, com mansões aí na área de Los Angeles se teve maior noção da tragédia ? Porque, infelizmente, há muitos incêndios nos Estados Unidos. Este acabou por ter maior notoriedade porque houve muitas estrelas que perderam muito aí ?
Com certeza: esta área do Pacífico e, por exemplo, na estrada Sunset Boulevard, que é uma das vias mais longas de Los Angeles, que começa no centro da cidade, vai até Malibu. É onde temos as maiores mansões, as maiores pessoas ligadas à indústria da...
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ADI diz que São Tomé e Príncipe vive situação "anormal" e que nomeação de Américo Ramos é uma "surpresa"
1/13/2025
O imbróglio político em São Tomé e Príncipe é uma "situação anormal" segundo o partido maioritário ADI, motivado por "razões pessoais" do Presidente Carlos Vila Nova, segundo explicou à RFI o secretário-geral do ADI, Elísio Teixeira.
Numa semana, São Tomé e Príncipe teve três primeiros-ministros diferentes. Na segunda-feira passada, Patrice Trovoada foi destituído pelo Presidente Carlos Vila Nova com acusações de deslealdade institucional, com a nomeação, entretanto, sob indicação do partido maioritário ADI, de Ilza Amado Vaz. Com a divulgação da lista de ministro da então primeira-ministra a acontecer antes do aval final do Presidente, Ilza Amado Vaz apresentou a sua demissão que levou depois à sua exoneração, com o Presidente a escolher no final do dia de ontem Américo Ramos como novo primeiro-ministro.
Do lado do ADI, mesmo se se trata de um antigo secretário-geral do partido, esta decisão não se compreende, já que o partido tinha sugerido o nome do advogado Adelino Pereira. Em entrevista à RFI, Elísio Teixeira, actual secretário-geral do ADI, admite que o partido foi surpreendido pela decisão do Presidente e que não ajudará a formar o próximo Governo.
RFI: Como descreve a situação política em São Tomé e Príncipe?
Elísio Teixeira: Claro que, do nosso ponto de vista, é uma situação anormal, porque o ADI ganha as eleições em 2022 com maioria absoluta e apresentou o candidato a primeiro ministro. Logo, tem toda a legitimidade para cumprir o mandato até 2026. Obviamente que havendo a demissão do primeiro ministro Patrice Trovoada e o ADI enquanto partido vencedor, apresenta um outro nome para dar continuidade ao programa sufragado em 2022, mas tendo em conta a natureza do conflito - que em certa medida não se consegue perceber porque parece que deixou de ser institucional e em parte passou a ser um conflito quase de natureza pessoal - então há nomes que foram rejeitados e pelo que o Presidente da República indicou, o primeiro ministro, pese embora seja oriundo do ADI, não foi indicado pela direcção atual do partido.
Portanto, podemos confirmar que o nome de Américo Ramos não foi indicado pelo ADI. Confirma isso?
Nós tínhamos indicado ontem o nome do advogado Adelino Pereira, que foi o nome da direcção do partido indicou ontem ao Presidente da República. Mas, entretanto, o Presidente da República nomeou o Dr. Américo Ramos, que é uma figura oriunda do ADI e para as funções de primeiro ministro.
Vocês tiveram alguma razão para essa renúncia em relação a Adelino Pereira.
Nós não tivemos retorno do Presidente e, embora tenhamos enviado o nome de Adelino Pereira, fomos depois digamos que surpreendidos com a nomeação do Dr. Américo Ramos.
E no vosso entender porque é que a escolha do Presidente recaiu sobre Américo Ramos?
Obviamente que entendemos que ele quer dizer que deve ser o ADI a continuar o programa sufragado em 2022 até 2026. Logo, digamos que escolheu uma figura oriunda do ADI, que foi recentemente secretário geral do partido. Até há bem pouco tempo, Américo Ramos foi deputado eleito pelo partido ADI. O Presidente da República indigitou-o como primeiro ministro talvez por ele ser oriundo do partido, pese embora não tenha sido indicado pela direcção do partido.
No vosso ponto de vista, trata se de um governo de iniciativa presidencial?
Tecnicamente sim, porque se a direcção do partido indica o nome e o nome do partido não é tido e se indica um outro nome... Neste momento entendemos que há aqui um Governo que foi formado de iniciativa presidencial.
Do vosso lado vocês pensam agora participar no processo de construção do Governo? Ou seja, reunirem se com Américo Ramos e tentar atribuir pastas a membros do ADI?
Não, não nos cabe a nós indicar nomes neste momento, tendo em conta que não foi o nome escolhido pela direção que é primeiro-ministro. Portanto, caberá ao primeiro ministro indigitado pelo Presidente formar o seu elenco e depois tratar de tudo o resto. Poderá ser que chame pessoas do ADI, mas neste momento...
Duration:00:07:38
Carlos Vila Nova podia ter utilizado "outros mecanismos" antes de destituição
1/10/2025
O antigo candidato às presidenciais Eugénio Tiny disse em entrevista à RFI que o Presidente Carlos Vila Nova tinha outros mecanismos antes de demitir Patrice Trovoada, como convocar a Assembleia Nacional. Já as prioridades para o novo Governo de Ilza Amado Vaz são a apresentação de um Orçamento do Estado, assim como o pagamento de salários em atraso na saúde e na educação.
Ilza Amado Vaz é a nova primeira-ministra de São Tomé e Príncipe, após a destituição do Governo de Patrice Trovoada na segunda-feira. Ilza Amado Vaz era até agora Ministra da Justiça, da Administração Pública e dos Direitos Humanos. Trata-se da terceira mulher a chefiar São Tomé e Príncipe.
Para Eugénio Tiny, ex-candidato às presidenciais e antigo vice-presidente da Assembleia Nacional, Ilza Amado Vaz é "uma personalidade de valor", mas contesta a organização do país, indicando que o Presidente Carlos Vila Nova podia ter recorrido a outras medidas antes de destituir o Governo.
"Temos que ser sinceros, nada funciona. Quando [o Presidente] fala do irregular funcionamento das instituições, é um facto real e nós não estamos aqui a fazer a defender ninguém. Porque eu também acho que o Presidente, antes de chegar à demissão do primeiro ministro, tinha outros mecanismos a nível da Constituição para utilizar. Podia convocar a Assembleia Nacional, podia convocar o Conselho de Estado, podia ir dirigir mensagem à Assembleia. [...] Ele podia ter aproveitado de facto esse espaço para que o assunto fosse realmente discutido. E aí talvez não se chegava a esse ponto, porque os deputados, mesmo pertencendo ao partido ADI, podiam chamar a atenção do seu líder, ou mesmo a oposição. Podia também chamar a atenção do primeiro ministro porque de facto também viajava demais", indicou o antigo deputado.
Eugénio Tiny defende assim uma mudança radical do sistema político em São Tomé e Príncipe, um sistema que considera estar actualmente corrompido pela corrupção e pela dependência do estrangeiro. Para já, cabe agora a Ilza Amado Vaz executar decisões importantes para o futuro do arquipélago.
"O novo governo tem que se ocupar é de questões prioritárias. Ou seja, a questão do Orçamento Geral do Estado, porque nós não temos sequer um orçamento. Muito menos uma proposta para ser discutida, analisada e aprovada. O país tem problemas financeiros e de financiamento gravíssimos. Não tem dinheiro. Não consegue sequer pagar salário de modo regular. Vai pagar os salários ao longo do mês a conta gotas. Tem ainda dívidas por pagar com pessoas que trabalharam para a Saúde, para a Educação. Houve quem não tenha recebido salário durante um ano e entrou no novo ano ainda sem salário. Tudo isto está por resolver", concluiu.
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Aldeias Infantis SOS de Cabo Verde implementam projecto de combate ao abuso sexual
1/10/2025
As Aldeias Infantis SOS de Cabo Verde implementam a partir deste mês de Janeiro o projecto “Djunta Mô” que pretende ajudar no combate ao abuso sexual contra crianças e adolescentes.
As Aldeias Infantis SOS de Cabo Verde implementam a partir deste mês de Janeiro o projecto “Djunta Mô”, que significa “só todos juntos conseguimos” para ajudar no combate ao abuso sexual contra crianças e adolescentes.
“Este projeto nasce no seguimento de um diálogo político já realizado anteriormente pela União Europeia em Cabo Verde, em que os atores da sociedade civil, neste diálogo apontaram a questão do aumento da problemática do abuso sexual das crianças e adolescentes ou exploração sexual das crianças e dos adolescentes e que haveria a necessidade do seu combate, verificar, portanto, qual é a debilidade. Uma das debilidades encontradas é a questão da rede de proteção, portanto, estarei explicando que um dos objetivos, além do combate em si ao abuso sexual nas crianças e adolescentes, bem como a questão da exploração, mas um dos pilares e dos objetivos também é o repouso da rede de proteção para, portanto, se conseguir alcançar o segundo objetivo. Portanto, a partir deste diálogo político identificado, desta problemática, a União Europeia avançou uma consulta junto de organizações da sociedade civil e entendeu~que as aldeias infantis SOS estariam posicionadas para elaborar este projeto, obviamente juntamente com outros parceiros de implementação, e seguirmos neste trabalho até dezembro de 2027, ou seja, é um projeto de três anos” avançou o director nacional das Aldeias Infantis SOS de Cabo Verde, Ricardo Andrade.
O projecto “Djunta Mô” das Aldeias Infantis SOS de Cabo Verde para ajudar no combate ao abuso sexual contra crianças e adolescentes vai ser desenvolvido nos municípios de São Filipe, na ilha do Fogo, da Praia e de Santa Catarina em Santiago. Concelhos onde registam mais casos e mais denuncias de abuso sexual contra crianças e adolescentes.
Embora afirmou que os dados abusos sexuais estão desfasados da realidade, Ricardo Andrade, disse que é na ilha do Fogo há mais casos de abuso sexual contra menores
“A Ilha do Fogo pelas razões claras porque lidera as questões das denúncias e também do abuso sexual em Cabo Verde. É de conhecimento de todos, são dados enunciados pelo ICCA e também na Ilha de Santiago, a sua tendência é de aumentar. Obviamente, a ambição seria alcançar todo o território internacional, por exemplo, esta problemática também tem uma incidência muito grande em Santo Antão, se fosse pelos números nós teríamos de chegar em termos local a Santo Antão, mas infelizmente pela limitação dos recursos não podemos chegar em termos de atuação local, mas estaremos chegando através da advocacy, através da comunicação via televisão, via redes sociais e também via rádio” disse Ricardo Andrade.
Em termos de denuncias de abuso sexual contra crianças e adolescentes adiantou que nos anos de 2021, 2022 e 2023 foram registados na ilha do Fogo, 52, 51 e 51 casos, recpectivamente.
“Mas verdade nós sabemos, a questão do abuso é muito maior, porque na Ilha do Fogo a questão da denúncia ainda é uma problemática para se trabalhar e é onde nós vamos trabalhar, porque por um lado, as comunidades muitas vezes não sabem que é um crime público, qualquer pessoa deve denunciar; segundo, muitas vezes não se conhece bem os canais de denúncia, ou então há uma certa descrença nos canais de denúncia e na efectividade da justiça ou ainda tem a questão dos bairros em que toda a gente conhece toda a gente, existe um certo embaraçamento para se trazer estas denúncias à luz do dia, devido às relações familiares, de amizade ou então até interesses outros e que acabam por impedir. E, na verdade, estes são os dados oficiais, mas sabe-se que, no fundo, são muito maiores” argumentou.
Em termos de Santiago Norte os dados oficiais mostram que nos anos 2021, 2022 e 2023, foram denunciados 26, 41 e 41 casos de abuso sexual de menores de idade. Já para Santiago Sul,...
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António Feijó Júnior publica novo livro sobre petróleo angolano
1/10/2025
António Feijó Júnior apresentou recentemente, em Lisboa, o livro "Refinação, armazenagem, distribuição e comercialização de derivados do petróleo. O papel dos biocombustíveis". A RFI falou com o autor sobre as novas refinarias a serem construídas em Angola, a exportação de derivados do petróleo para países vizinhos, a indústria petroquímica, os biocombustíveis e a redução da emissão de CO2. Oiça aqui.
António Feijó Júnior tem largos anos de experiência na indústria petrolífera, em Angola e no estrangeiro, no sector público e privado. O vasto conhecimento técnico, acumulado ao longo de uma vida profissional dedicada ao "ouro negro" permite-lhe tornar acessível a complexidade da indústria petrolífera.
Depois de em 2017 ter lançado o livro "Petróleo uma indústria globalizada", um trabalho com foco no "upstream", que compreende as actividades de exploração e produção de petróleo, António Feijó Júnior apresentou recentemente, em Lisboa, o livro "Refinação, armazenagem, distribuição e comercialização de derivados do petróleo. O papel dos biocombustíveis" editado pela Perfil Criativo - Edições. A obra, pensada e executada com rigor, proporciona um entendimento sobre a cadeia de "downstream", que engloba o processamento do petróleo bruto e o escoamento dos derivados a serem consumidos.
A RFI aproveitou a presença de António Feijó Júnior em Portugal para uma entrevista em que, entre outros temas, se fala das novas refinarias a serem construídas em Angola, da exportação de derivados do petróleo para os países vizinhos de Angola, da indústria petroquímica, dos biocombustíveis e a redução da emissão de CO2 ou a utilização de terras aráveis para a produção de biocombustíveis.
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